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Quem viveu um dia sem água em casa sabe bem como é difícil encarar as tarefas diárias. Agora imagine mais de 1.600 dias nessa condição. É assim que vivem os moradores de Alagoinha (232 km do Recife), onde falta água nas torneiras desde julho de 2012.
Segundo a Compesa
(Companhia Pernambucana de Saneamento), Alagoinha foi o primeiro município
a entrar em colapso em Pernambuco. Hoje, existem mais 27 cidades no Estado sem
água nas torneiras.
Na cidade, a rotina dos
moradores já parece acostumada com a vida sem água: eles lotam diariamente os
quatro chafarizes montados pela prefeitura e que são abastecidos quase que
diariamente pelos carros-pipa pagos pelo Exército.
Nem lembro mais o que é
ter água na torneira",conta Severino André Costa, 46.
"Venho de dois em
dois dias aqui no chafariz. A água é boa, faço tudo com ela", diz o
desempregado que vive do Bolsa Família e, para completar a renda, vende
cartelas de bingo.
Como são apenas
quatro pontos de distribuição na cidade, os moradores precisam, em alguns
casos, fazer longas caminhadas com baldes para buscar água.
No chafariz do Matadouro
Municipal, cada família tem direito a seis baldes de água por dia. Esmeraldo
Galindo, 62, é um dos que vai ao local quase que diariamente buscar água.
Para se cansar menos,
Esmeraldo usa uma vara e a coloca sob os ombros, com um balde em cada ponta.
"É o jeito, melhor fazer isso que viver sem água. Uso essa água para tudo
em casa, menos no banheiro. Para não gastar, pego uma água mais suja do açude
da prefeitura", relata, citando ter "consciência de que a água é um
bem precioso".
Já Margarida da
Conceição, 41, mora com mais sete pessoas --o marido e seis filhos-- e diz que
não sabe o que seria da vida sem a água dada no chafariz. "Se está ruim
por não ter água na torneira, muito pior seria se não tivesse essa água aqui.
Moro pertinho, para mim é bom", relata.
Wyllison Alves é
responsável pelo chafariz do centro da cidade e conta que os moradores fazem
fila sempre antes de encher os baldes. "É uma água boa que servimos, que é
pega em uma fonte a 200 km de distância. Antes pegava aqui mais próximo, em
Belo Jardim (55 km de Alagoinha), mas a fonte secou. A água num instante acaba,
não dura nem uma hora", diz, citando que, por dia --exceto
às segundas--, chegam ao local entre 9.000 e 15 mil litros de água, a
depender do caminhão.
Comércio da água
Com a seca, o maior
comércio da cidade hoje é a água. Genivaldo Galindo vende água mineral há
quatro anos. Ele foi distribuidor de água de uma empresa por 20 anos, mas em
2012, já com a seca, decidiu cavar um poço em uma propriedade em Buíque
(município vizinho), comprar um caminhão e vender água de porta em porta. Como
a água é potável, vende por R$ 19 cada 100 litros da água.
"Hoje mesmo vendi
40 recipientes (de 100 litros). Quem compra a minha água é quem tem uma certa
condição, não é só por causa da seca. Só não vendo mais porque falta dinheiro
na cidade", explica.
Por conta da estiagem,
ele percebeu já uma diminuição de vazão do seu poço e já começa a enfrentar
problemas.
"A água já diminuiu
uns 50% e tem dia que já preciso comprar".
A situação é mais cômoda
para quem tem dinheiro para comprar água. Lúcia Cármen, 57, conta que compra um
carro-pipa por mês para encher a caixa d'água de casa. Assim, ela pode guardar
e ter água na torneira. "A água é boa, não tenho o que reclamar",
diz, citando que paga R$ 180 pelo caminhão de 8.000 litros que dura todo o mês.
No município inteiro não
há mais nenhum ponto de acúmulo de água. A barragem Joaquim Américo, que sempre
serviu à zona rural, secou. Na outra --e maior-- barragem, a João Inácio,
construída em 1970, só resta lama e água suja. "Nunca essa barragem secou.
Ela tinha 3 km de lâmina d'água e 10 metros de altura. Agora esse restinho nem
os animais bebem", conta Eronildes Ferreira, presidente do Sindicato dos
Trabalhadores Rurais do município.
Durante a visita à zona
rural do município, a reportagem do UOL encontrou pelo menos dois
animais mortos à beira da estrada. "Infelizmente não é incomum ver essa
cena. Os animais estão morrendo por falta de água mesmo, não há mais onde
buscar", explica Ferreira.
Segundo a Compesa, a
solução para normalizar o abastecimento de água na cidade só ocorrerá com a
conclusão da Adutora do Moxotó, que tem obras previstas para terminar em abril
de 2018. A obra poderá ser antecipada em três meses, segundo a empresa,
"caso o cronograma de desembolso enviado pela Diretoria da Compesa ao
Ministério da Integração seja mantido."
A obra custa R$ 100
milhões e levará água do eixo leste da transposição do rio São Francisco, que
tem previsão de conclusão ainda no primeiro semestre de 2017. A adutora vai
levar água a 325 mil pessoas de sete municípios do Estado.
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