Mais que palavras, eles querem ações. As 45,6 milhões de
pessoas com deficiência no Brasil – representam 23,9% da população, segundo o
Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) –
necessitam de políticas públicas que possibilitem a real inclusão e façam valer
as leis que as beneficiam. O discurso na língua brasileira de sinais (libras)
da primeira-dama Michelle Bolsonaro, no último dia 1º, durante a posse do seu
marido Jair Bolsonaro como presidente da República, em Brasília, deu
visibilidade aos surdos. Mas o desejo de brasileiros que convivem com alguma
deficiência é que no governo federal o discurso se transforme em prática.
“Foi muito bom pra comunidade surda o discurso de Michele
Bolsonaro ser em libras. Nos trouxe uma grande emoção. Mas não é ela que vai
mandar no País. Precisamos acompanhar o governo, observar como será daqui pra
frente”, observa o professor René Ribeiro Hutzler, 41 anos, que conversou com a
reportagem do JC com a ajuda da intérprete Simone Lira, da Faculdade Alpha, na
área central do Recife.
Ex-presidente da Associação de Surdos de Pernambuco (a
entidade está com o cargo vago), René Hutzler enumera os desafios para quem não
ouve. “A comunicação é nossa principal barreira. Para ser atendido num
hospital, para explicar a um médico o que sentimos, para comprar numa loja,
tudo é difícil”, conta o professor, que nasceu surdo, mas a deficiência só foi
diagnosticada quando ele tinha 2 anos.
Pernambuco tem 27,58% da população com algum tipo de
deficiência, o que representa 2,4 milhões de pessoas. Dessas, a Frente
Parlamentar da Pessoa com Deficiência da Assembleia Legislativa do Estado
estima que 325 mil sejam surdas. “A política pública para pessoa deficiente tem
que ser permanente, mas sabemos que depende muito do gestor. E deve ser para
todos, independentemente da deficiência”, ressalta o superintendente estadual
da pessoa com deficiência, Edmílson Silva, que é cadeirante.
O coordenador do Centro de Apoio aos Surdos, unidade
mantida pelo governo estadual no bairro de Casa Amarela, Zona Norte do Recife,
Marcelo Manoel da Silva, defende a implantação de escolas bilíngues (quando é
priorizada a libras como língua primária e o português escrito como língua
secundária).
“O que existe atualmente são turmas bilíngues”, diz Marcelo
Manoel, também auxiliado por um intérprete. Na capital, a prefeitura atende 73
alunos com deficiência auditiva. Existem oito escolas municipais com turmas
bilíngues e em 2019 serão nove. Na mesma sala há estudantes ouvintes e surdos.
Nas escolas estaduais há 972 alunos surdos.
“A Lei Brasileira de Inclusão tem que ser cumprida.
Necessitamos de práticas concretas. O Rio de Janeiro sedia o Instituto Nacional
de Surdos do Brasil. Bolsonaro foi deputado por 28 anos lá e não tenho
conhecimento de apoio dele lá para o instituto. Tenho dúvida se o discurso da
primeira-dama em libras não foi só marketing”, observa Marcelo Manoel. O centro
que ele coordena tem unidades semelhantes em Limoeiro, Caruaru, Garanhuns e
Arcoverde. Nesses locais são ofertados gratuitamente cursos de libras para
surdos e para o público em geral.
POLÊMICA
No Ministério da Educação (MEC) foi extinta a Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), que
tratava da educação inclusiva. No lugar dela foram criadas duas novas
secretarias: de Alfabetização e de Modalidades Especializadas. Segundo o MEC,
“as competências da Secadi não foram extintas. E houve uma atenção especial
para a comunidade surda, com a criação, na Secretaria de Modalidades
Especializadas, da Diretoria de Políticas de Educação Bilíngue de Surdos”,
assegura o órgão.
“Essa mudança causou uma certa confusão, mas acho cedo para
avaliar se foi boa ou ruim. Vamos acompanhar”, diz o arquiteto Marcelo Pedrosa,
39 anos, ativista da comunidade surda. Ele criou a campanha Legenda para quem
não ouve, mas se emociona. “É importante fiscalizar as leis que já existem,
como a que garante a acessibilidade comunicacional. Nem todo filme tem legenda.
Temos direito ao lazer”, destaca Marcelo Pedrosa, surdo desde os 2 anos. Com o
uso de aparelhos auditivos, ele consegue falar sem precisar da libras.
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