Em um claro aceno à negociação com a classe política,
o novo ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que são os
políticos, e não os técnicos como ele, quem terão de conduzir o processo de
crescimento econômico do país, com o apoio às reformas estruturantes que ele
pretende apresentar, como a da Previdência. Afirmou ainda que, caso a
reforma da Previdência, sua prioridade absoluta, não seja aprovada, será
necessário haver uma desvinculação do orçamento, o que seria feito também por
intermédio de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Ou seja, continuaria
dependendo do apoio de deputados federais e senadores.
"Se for bem sucedido (desafio de aprovar a reforma da
Previdência), temos 10 anos de crescimento pela frente. Se não for, temos
sugestões também...você desindexa, desvincula e desobriga todas as despesas e
receitas da União", disse Guedes em seu primeiro discurso como o
ministro mais poderoso da Esplanada de Jair Bolsonaro.
Passar as mudanças na aposentadoria passarem no Congresso é
o maior desafio de Guedes, já que o tema é impopular e a base parlamentar de
Bolsonaro não tem os votos suficientes para fazê-lo. O simples fato de cogitar
uma derrota na questão parece não ter agradado os economistas das principais
corretoras do país, reporta o jornal Valor Econômico. O incômodo
também acontece porque a alternativa que apresenta não é considerada suficiente
em termos fiscais e tampouco parece de fácil execução: deixar de ter
percentuais obrigatórios do Orçamento para o investimento em Saúde e Educação,
por exemplo, tampouco costuma ser um tema popular. Segundo o Tesouro, o Governo
tem 98% da receita líquida comprometida com os gastos vinculados, o que os
analistas consideram uma margem insustentável. Nesta conta, os gastos com a
Previdência, incluindo a dos militares que o Governo Bolsonaro não cogita
mudar, são, de longe, a maior fatia: respondem por 47% dos gastos, seguido do
pago ao pessoal da ativa (24%).
“Hoje, ela [a classe política] não faz as escolhas, ela
observa”, argumentou Guedes durante a cerimônia de transmissão de cargo na qual
se concretizou a fusão dos ministérios do Planejamento, da Fazenda e do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio. Ao abrir as portas às negociações, o
ministro disse que estava fazendo uma conclamação, um pedido de ajuda, mas
também criticou os privilégios de legisladores e juízes, que recebem polpudas
aposentadorias. “Quem legisla e julga tem as maiores aposentadorias e a
população, as menores”. Nos primeiros dias da gestão, o ministro promete que
apresentará uma série de propostas infraconstitucionais para alterar a economia
do país e, só depois da posse dos novos congressistas, em fevereiro, trará a
reforma previdenciária.
Em sua avaliação, caso a reforma seja aprovada em dois ou
três meses, o país terá dez anos de crescimento sustentável. Se não a for,
novas medidas terão de ser pensadas. Nessa mesma linha, afirmou ainda que seu
acelerado plano de privatizações – que ainda não foi detalhado – poderá
resultar em um crescimento anual de 3% a 3,5%. Em 2017, o Brasil cresceu 1%,
após dois anos de retração.
No discurso, Paulo Guedes refutou a alcunha que
especialistas e a imprensa têm lhe dado, de superministro. “Isso aí vai ser uma
construção conjunta. Não existe o superministro, alguém que vá consertar os
problemas do país sozinho”. Reclamou do lobby realizado para evitar a fusão dos
ministérios e disse que, quem defendia o ministério da Produção, que lhe
tiraria o Desenvolvimento, Indústria e Comércio, o fazia porque queria manter
privilégios. “Teve gente que tentou impedir a fusão dos ministérios, queriam
criar o ministério da Produção, tudo para manter o boi na sombra. Mas nós fomos
buscar o boi”.
Disse que precisará também da ajuda dos outros poderes e da
imprensa. O aceno aos meios de comunicação foi até agora incomum entre os
representantes do Governo Jair Bolsonaro (PSL). O qual Guedes diz que
não é de extrema direita. “Depois de 30 anos de uma aliança política de centro
esquerda, há uma aliança entre conservadores em costumes e liberais em
economia. É uma centro-direita”.
O ministro defendeu sua equipe, formada por diversos
representantes da Escola de Chicago, até então chamados de Chicago boys,
ele os apelidou agora de Chicago oldies, porque a maioria deles já passou
dos 60 anos de idade. Afirmou, por exemplo, que os liberais, como ele, não são
contra os programas sociais. Defendeu que uma prova disso são os vouchers
de educação, como os que foram dados pela ditadura de Augusto Pinochet no Chile
na década de 1980.
O discurso durou quase uma hora e foi dividido pelo
ministro em tópicos. Escrito em pequenos pedaços de papel do tamanho de duas
cartas de baralho juntas. Como de costume, a fala do responsável pela “chave do
cofre” do governo federal é o mais esperado. Os espectadores que acompanharam a
posse estavam eufóricos. A cada análise feita em tom descontraído, aplausos e
mais aplausos. Um dos momentos em que ele foi mais aplaudido foi quando repetiu
uma espécie de mantra seu, em que critica os financiamentos feitos pelo BNDES
nos governos petistas. “Não foi no microcrédito que os bancos públicos se
perderam. Eles se perderam nos grandes empréstimos em que piratas privados, burocratas
corruptos e criaturas do pântano político se associaram contra o povo
brasileiro”.
Apesar da ânsia em realizar mudanças, Guedes diz que elas
serão feitas sem pressa, no tempo em que for possível realizá-las. “Não adianta
colocar uma bola de ferro na perna direita do empresário, que são os juros
altos, uma bola de ferro na perna esquerda, que são os impostos, e um piano nas
costas, que são os encargos sociais e trabalhistas. E ainda ouve: corre porque
o chinês vai te pegar”. O novo czar da economia também prometeu lutar
por nova reforma trabalhista. (EL País Brasil)
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