O Brasil está sendo visto de fora como o país da barbárie
cotidiana. Ao considerar a cobertura que a imprensa internacional tem feito do
mais recente massacre em presídio do país, o que se vê é que a rotina do país é
marcada pela selvageria.
A essa impressão se junta a percepção externa das
declarações do presidente da República, Jair Bolsonaro, sobre o caso no Pará e
especialmente sobre o desaparecimento de militantes na época da ditadura. No
total, quem vê do exterior tem a impressão de uma nação dominada por
desumanidade.
A imagem mais marcante nas discussões sobre o país no resto
do mundo nesta semana é a de um vídeo com imagens "chocantes", que
mostram cenas terríveis de "presidiários jogando futebol com cabeças"
após mais um massacre em um centro de detenção no Brasil, como relata o New
York Post.
Tabloides dos Estados Unidos e da Inglaterra publicaram o
vídeo, e vários outros veículos descreveram as cenas que mostram um nível
assustador de barbárie ao resto do mundo.
"Quando um presídio no Brasil se tornou um caos
durante uma revolta de gangues violentas que deixou pelo menos 57 mortos
–incluindo 16 decapitados– vários presos celebraram chutando as cabeças
decepadas das vítimas", relata o site da rede de TV dos EUA Fox News.
Descrições semelhantes se espalharam por vários outros
veículos de imprensa pelo mundo.
Um dos focos centrais da cobertura internacional, e que
afeta mais diretamente a imagem do país, é que esse não foi um caso isolado.
Para publicações como o New York Times e o Washington Post,
por exemplo, o mais marcante do massacre desta semana é que ele parece fazer
parte de algo que acontece com frequência no Brasil.
"O confronto entre gangues rivais no centro de
detenção em Altamira, no estado do Pará, na segunda-feira, foi o mais mortífero
surto de violência no Brasil em quase três décadas. Mas não foi uma surpresa
para os especialistas que assistiram à explosão da população de presos do país,
enquanto gangues poderosas asseguram cada vez mais controle sobre as
instalações de detenção", relata o NYT.
Segundo o jornal, o massacre foi uma tragédia anunciada.
De forma parecida, o Washington Post diz que o caso é parte
de uma tendência que não deve acabar tão cedo. O jornal publicou uma reportagem
sobre o massacre perguntando em seu título: "Por que o Brasil tem sido tão
propenso a massacres em presídios?".
"O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, chegou ao
poder em parte por prometer combater crimes violentos e atividades de traficantes,
prometendo 'encher as celas de prisões com criminosos'. O problema, dizem os
especialistas, é que o governo não se comprometeu a fornecer recursos ao
sistema carcerário superlotado e subfinanciado para lidar com o aumento da
população presa", diz.
Segundo o Post, "a abordagem linha dura de Bolsonaro
está agravando uma crise que já levou a vários episódios chocantes de violência
letal".
"Ao insistir no alto encarceramento em prisões
superlotadas, Bolsonaro quer aumentar a dose do veneno que está nos matando",
diz um especialista citado pelo jornal.
Enquanto a cobertura do massacre pintava essa imagem de
barbárie no Brasil, o governo não apenas deixou de agir de forma que pudesse
mostrar que os casos não representam a realidade do país, como deu declarações
que ampliaram uma percepção negativa sobre o Brasil.
Isso fica evidente quando jornais como o NYT publicaram o
comentário de Bolsonaro sobre o massacre. "Perguntado sobre a violência, o
presidente Jair Bolsonaro, que endossou políticas duras contra o crime, teve
pouco a dizer. 'Pergunte às vítimas daqueles que foram mortos o que eles
pensam', disse ele a jornalistas". A declaração reforça a ideia já
associada ao Brasil de que muitos no país pensam que bandido bom é bandido
morto, o que vai contra qualquer visão humanitária ou de respeito aos direitos
humanos em qualquer parte do mundo.
Além disso, as declarações de Bolsonaro no ataque ao
presidente da OAB Felipe Santa Cruz, dizendo que poderia explicar a ele como o
pai dele desapareceu durante a ditadura militar, também ganharam repercussão
que reforça esta imagem de barbárie.
Um exemplo disso é uma reportagem da agência de notícias
France Presse (AFP), que foi publicada por vários veículos de imprensa em
diferentes países. Segundo o texto, as declarações de Bolsonaro geraram fortes
críticas no país.
A AFP também destacou o fato de que o posicionamento de
Bolsonaro não foi um caso isolado.
"Bolsonaro, um admirador descarado dos ex-ditadores do
país, provocou revolta generalizada e vários protestos de rua em março, quando
ordenou que os militares comemorassem o 55º aniversário do golpe. No passado,
ele se referiu ao regime militar como um tempo 'glorioso' na história do
Brasil. Ele foi citado em 2008 dizendo que 'o erro da ditadura foi que ela torturou,
mas não matou'."
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SOBRE O AUTOR
Daniel Buarque é jornalista, escritor e fez mestrado sobre
a imagem internacional do país pelo Brazil Institute do King's College de
Londres. É autor de cinco livros, incluindo “Brazil, um país do presente - A
imagem internacional do ‘país do futuro’” (Alameda Editorial) e escreveu o
livreto “Brazil Now” da consultoria internacional Hall and Partners. Nascido no
Recife, escreve regularmente para o UOL e já trabalhou como editor-executivo do
portal Terra, chefe de reportagem da rádio CBN, pauteiro de Mundo da Folha de
S. Paulo e repórter do Valor Econômico e do G1. (Blog do Brasilianismo)
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