O recente bate-boca entre o presidente francês Emmanuel
Macron e o mandatário brasileiro Jair
Bolsonaro sobre os incêndios na Amazônia foi um presente para ambos.
Ao afirmar que votaria contra o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul,
Macron recebeu apoio tanto dos ambientalistas, que detestam o presidente
brasileiro, quanto dos agricultores franceses, que se opõem ao pacto.
Bolsonaro, por outro lado, também saiu ganhando, pois o episódio fortaleceu a
narrativa nacionalista do presidente brasileiro de que o país está sob ataque
externo —e como mostra o exemplo de Trump, não há nada melhor para um líder
populista do que ter poderosos inimigos externos, mesmo imaginários, que
ameaçam a nação. Além de Macron, o primeiro ministro irlandês, Leo Varadkar,
também anunciou que, nas atuais condições, não estaria disposto a apoiar a
ratificação do acordo comercial finalizado neste ano, depois de duas décadas de
negociações.
O confronto pode ter dominado as manchetes dos jornais, mas
ele diz relativamente pouco sobre as probabilidades reais do acordo ser
derrubado por causa da política ambiental do governo Bolsonaro. Afinal, tanto a
França quanto a Irlanda sempre foram os mais céticos em relação à iniciativa, e
apenas aproveitaram-se dos incêndios para reafirmar suas posições. Um debate
muito mais complexo e provavelmente decisivo acontece na Alemanha, um dos
grandes defensores do acordo, mas que tem hoje o movimento ambientalista mais
influente do mundo. O Partido Verde alemão obteve o melhor resultado da sua
história nas recentes eleições para o Parlamento Europeu, e pesquisas recentes indicam
que em torno de 25% dos alemães hoje votariam nele— ameaçando a liderança do
partido conservador de Angela
Merkel, que obteria aproximadamente 27%. Há anos, os verdes alcançaram
o mainstream político, e muitos observadores estimam que é uma
questão de tempo até o país ter seu primeiro chefe de Governo do Partido Verde.
Paradoxalmente, o outro partido em ascensão, a AfD, da extrema-direita, também é contra o acordo,
apesar de estar alinhado com Bolsonaro em relação a temas como migração,
‘anti-globalismo’ e a negação das mudanças climáticas.
A disputa sobre como reagir à política ambiental de
Bolsonaro apenas começou, mas já causou divisões públicas entre ministros do
Governo, algo raro na política alemã. Quando o ministro de Cooperação
Internacional da Alemanha, Gerd Müller, visitou o Brasil em julho e se reuniu
com Ricardo Salles para debater a demanda brasileira de
alterar a estrutura de governança do Fundo Amazônia, o alemão demonstrou
preocupação, mas também otimismo quanto à superação das divergências entre os
dois países. Reagindo à pressão de movimentos ambientalistas, porém, a ministra
alemã do Meio Ambiente, Svenja Schulze, anunciou paralelamente que congelaria o
financiamento de projetos ambientais no Brasil. Apesar de eles não terem
relação com o Fundo Amazônia, criou-se a percepção de que o Governo
alemão não tem uma posição unificada sobre o tema. Não ajudou em nada o fato de
a ministra alemã da Agricultura, Julia Klöckner, parecer apoiar uma postura
mais dura, ao afirmar que,
nas atuais condições, se oporia à ratificação do acordo. Müller publicamente
respondeu, afirmando que ameaças públicas contra Bolsonaro não levariam ao
resultado desejado. Afinal, o objetivo não era punir o Brasil, mas proteger a
Amazônia. Fonte: El País.
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