Nos últimos dias, ninguém viu um barbeiro sequer em
Ibimirim, cidade do Sertão de Pernambuco onde ocorreu o surto de doença de
Chagas que envolve 77 participantes de evento religioso em abril. A Secretaria
Estadual de Saúde (SES), com apoio do município, comandou visita à escola onde
ficaram as pessoas expostas à microepidemia e também a cerca de 30 casas do
entorno. Nem vestígio do inseto até agora. O panorama chega mais perto da
confirmação da hipótese de que os adoecimentos têm relação com a transmissão oral,
decorrente da ingestão de comidas contaminadas com os parasitas. A constatação
leva a SES a criar uma nova realidade de enfrentamento: romper o risco de
transmissão da doença pela alimentação. Mesmo sem também detectar o barbeiro em
comidas nem em água, a vigilância continua constante.
“É muito provável que tenha sido transmissão oral. Então,
vamos abrir outra frente, além do controle do vetor (do inseto) que já existe,
para alertar a população em relação à procedência dos alimentos e à forma de
manuseio deles. Também vamos reforçar a vigilância para identificar a possível
presença do vetor (em alimentos). Isso acontece com frequência no Amazonas,
onde esse tipo de contaminação é muito comum pelo açaí”, informa a
superintendente de Vigilância de Doenças Negligenciadas da SES, Marcella Abath.
Ela destaca entre as principais medidas de prevenção a intensificação de ações
de vigilância sanitária em todas as etapas da cadeia de produção de alimentos
suscetíveis à contaminação.
“Na prática, será
necessário formar profissionais capazes de orientar a população sobre práticas
de higiene e utensílios para manipulação de alimentos, em especial os
consumidos in natura. É importante ainda alertar para o consumo de carne de
caça (de animais silvestres, como o tatu) crua ou mal passada”, acrescenta
Marcella Abath.
No caso da investigação do surto em Ibimirim, as dúvidas
também giram em torno das comidas levadas para o município pelos participantes
do evento. “Precisamos analisar até os produtos que saíram da Região
Metropolitana do Recife, como foram processados e manuseados.” Para Marcella
Abath, esse é um desafio e tanto, já que a retrospectiva das refeições está
sendo feita entre os 77 pacientes. “Não é fácil, pois são dezenas de pessoas,
além de muitos alimentos envolvidos. Precisamos tentar puxar da memória o que
cada um comeu no café da manhã, almoço, jantar e lanches. É uma análise
minuciosa.”
A suspeita desse tipo de contaminação é compatível com as
principais formas de transmissão de Chagas ocorridas recentemente no País,
segundo o Ministério da Saúde: 72% foram por transmissão oral; 9% por
transmissão vetorial e 18% não identificadas.
PACIENTES
Balanço divulgado ontem pela SES revela que, entre as 77
pessoas expostas à microepidemia, 62 fizeram coleta de sangue para análise,
realizada pelo Laboratório Central de Pernambuco (Lacen-PE), no Recife, e pelo
Laboratório da 6ª Regional de Saúde, com sede em Arcoverde e que congrega 13
municípios do Sertão, incluindo Ibimirim.
Até o momento, foram confirmados 27 casos de doença de
Chagas – todos em tratamento. Entre eles, 22 tiveram diagnóstico laboratorial
(seis não manifestaram sintomas da enfermidade). Do total de pacientes com
confirmação de Chagas, nove foram internados no Hospital Universitário Oswaldo
Cruz (Huoc), em Santo Amaro, área central do Recife. Três já receberam alta, e
os demais estão estáveis, com boa evolução do quadro clínico.
Por Cinthya Leite/JC Online
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